terça-feira, 12 de janeiro de 2010

LULA E OS ESTRAGOS DO DECRETO

ESTADÃO, OPINIÃO, 100112
O presidente Lula voltou a Brasília, depois das férias, com o objetivo imediato de acabar com a briga entre ministros, pôr ordem na casa e cuidar dos estragos causados pelo infeliz decreto sobre o Programa Nacional de Direitos Humanos, assinado por ele mesmo em 21 de dezembro. Pelo menos um erro o presidente reconheceu: não se deveria ter incluído no texto a proposta de revogação da Lei da Anistia, de 1979. Melhor deixar o assunto para o Judiciário, porque a lei já foi contestada pela Ordem dos Advogados do Brasil e o Supremo Tribunal Federal deverá julgar a ação neste ano. Mas o erro foi cometido em várias etapas.
A primeira contribuição foi do secretário Nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, responsável pelo texto original do decreto. A segunda foi da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Era sua obrigação desarmar a bomba e prevenir o presidente. A terceira, e conclusiva, foi do próprio Lula, ao assinar o papel.
Atribuem-lhe a declaração de que assinou sem ler. Pode ser verdade. Mas pode ser também que o tenha lido sem pensar nas consequências. A segunda hipótese parece improvável, porque o decreto tem 92 páginas e o presidente, como se sabe, é avesso à leitura. Mas isso não o isentaria de responsabilidade.
O fato é que ele escorregou mais de uma vez. Um de seus enganos foi confiar na atenção e na qualidade do julgamento da ministra-chefe da Casa Civil, sua candidata à Presidência. Se eleita, ela talvez tenha mais sorte que Lula na escolha da figura mais importante do gabinete ? alguém capaz de ler e de avaliar os documentos entregues para o chefe assinar.
Mas o presidente ainda pode evitar maiores danos. Se eliminar o revanchismo embutido no decreto, poderá acomodar a situação com os comandantes militares e livrar o ministro da Defesa, Nelson Jobim, de uma situação muito desconfortável. Com isso, talvez tenha de aceitar a demissão de seu secretário nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, mas isso será um bônus, não um custo.
Sobrariam, no entanto, outros problemas. O revanchismo e a tentativa de revogação da Lei da Anistia são apenas uma das várias fontes de conflito reunidas no decreto. Na sexta-feira, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, criticou o texto assinado por Lula. O documento, segundo ele, é preconceituoso em relação à agricultura de mercado, principal suporte do superávit comercial e da estabilidade de preços.
Na sua opinião, as mudanças legais propostas pelo decreto deverão aumentar "a insegurança jurídica no campo". Quanto a isso, não podem pairar dúvidas. O decreto defende, entre outras aberrações, um exercício de mediação entre invasores e vítimas de invasão de propriedades, antes da decretação, pelo juiz, da reintegração de posse. Invasão ainda é crime e invasores não podem ter o mesmo status legal de suas vítimas, mas o autor do texto parece desconhecer ou desprezar esse e outros detalhes. O mesmo decreto propõe subordinar ao assembleísmo de organizações "populares" as decisões de aumento de plantio de várias culturas de grande importância comercial para o País.
O secretário nacional de Direitos Humanos acusou seus críticos de desejarem transformar o plano em "monstrengo político único no planeta". Pura injustiça. O decreto já nasceu um monstrengo e seu autor é ele mesmo. Mas não é "único no planeta". Pertence a uma velha e grande família. Entre seus antepassados incluem-se as leis criadas pelos governos mais totalitários e mais brutais do século 20.
Entre os parentes contemporâneos é fácil apontar, por exemplo, as aberrações do regime instaurado pelo venezuelano Hugo Chávez e outras produzidas ou meramente ensaiadas por vários chefes populistas latino-americanos. As ameaças à liberdade de expressão e de informação, em nome de direitos humanos, são típicas dessa família de concepções políticas, assim como a intenção de converter o ensino da História em ferramenta de controle ideológico. Portanto, monstrengo, sim, mas não único em sua espécie.
Para cuidar dos danos causados pelo decreto, o presidente Lula terá de entender a extensão do problema. Não basta cuidar da polêmica entre os chefes militares e o secretário Paulo Vannuchi, nem atenuar aqui e ali as ameaças ao agronegócio. O decreto é totalmente ruim, porque é de natureza ditatorial. É esse o problema real, e o presidente sabe disso mesmo que não o tenha lido.

MILITARES QUE PRENDERAM ZELAYA SERÃO PROCESSADOS

Os comandantes das Forças Armadas que prenderam o ex-presidente de Honduras Manuel Zelaya, em junho de 2009, e o expulsaram do país serão processados pela Corte Suprema hondurenha. A ação foi movida pelo Ministério Público hondurenho que acusa os militares de abuso de autoridade e expatriação ilegal. As informações são da Agência BrasiI.
O presidente da Corte Suprema, Jorge Rivera, afirmou que vai ouvir os comandantes militares na próxima quinta-feira (14/1). Preocupado com as repercussões, o juiz alertou que o local escolhido para ouvir os comandantes deve ter segurança garantida. Segundo ele, a escolha deve considerar ainda a comodidade dos denunciados.
Determinado a assumir o poder, Zelaya retornou a Honduras e está abrigado na Embaixada do Brasil na capital hondurenha há cerca de quatro meses. Zelaya tem uma ordem de captura por vários crimes relacionados a uma consulta popular que pretendia fazer para promover uma Assembleia Constituinte no dia 28 de junho, mesmo dia em que os militares o detiveram e o expulsaram do país e quando o Parlamento designou Roberto Micheletti em seu lugar. O país fez eleições presidenciais em novembro.
Consultor Jurídico

EXÉRCITO FECHA 70 LOJAS QUE REAJUSTARAM PREÇOS NA VENEZUELA

Fonte: BBC Brasil
Economia Internacional
Autoridades venezuelanas fecharam na segunda-feira cerca de 70 estabelecimentos comerciais sob a acusação de aumentarem os preços para se aproveitarem da desvalorização do bolívar. Na última sexta-feira, o presidente Hugo Chávez havia derrubado a cotação da moeda local em relação ao dólar.
Desde 2005, o governo mantinha a moeda americana a 2,15 bolívares. Agora, para produtos essenciais, como comida, remédio e máquinas, a cotação passou para 2,6 bolívares por dólar. Para os demais produtos, o aumento foi de quase 100%, chegando a 4,3 bolívares por dólar.
Com o objetivo de impedir que os comerciantes aumentassem imediatamente o preço dos produtos que foram importados pela cotação antiga, Chávez pediu aos venezuelanos que denunciassem qualquer remarcação de preços. Ele também ordenou ao Exército que assuma o controle do que chamou de "empresas especuladoras".
Empresas fechadas
No domingo, Hugo Chávez afirmou: "alguns burgueses, oligarcas (...) estão dizendo que, por causa das medidas anunciadas na sexta, eles terão de aumentar todos os preços. De maneira alguma vamos aceitar".
Com base nisso, o Instituto para a Defesa das Pessoas e o Acesso a Bens e Serviços (Indepabis) inspecionaram 96 comércios e fecharam, com ajuda do Exército, 70 deles, segundo a agência estatal ABN. Os principais alvos foram as grandes redes de supermercados.
Os venezuelanos por sua vez, trataram de correr às lojas para tentar aproveitar os preços sob a cotação antiga. A reportagem da BBC flagrou uma fila que dobrava a esquina em uma famosa loja de eletrodomésticos na capital Caracas. Um dos consumidores, parecendo pouco otimista em relação à alta nos preços, disse que "mais vale uma lavadora na mão do que cem voando".
Inflação
O presidente venezuelano justificou a desvalorização dizendo que o plano vai reduzir as importações e estimular as exportações do país. No entanto, críticos afirmam que a medida vai alavancar a inflação no país, que já é a mais alta da América Latina.
Segundo dados oficiais, a inflação venezuelana em 2008 foi de 30% e a do ano passado chegou a 25%. Comerciantes locais afirmaram que ainda não sabem quando nem quanto, mas que inevitavelmente os preços vão subir.
O panorama inflacionário é explicado em parte pelo controle do câmbio. Para importar, as empresas do país precisam de autorização do governo, que fornece os dólares para a transação. Quando os recursos não são suficientes, os empresários recorrem ao mercado paralelo de dólar, em que a moeda vale mais de 6 bolívares, ou desistem da troca complementar, o que muitas vezes os obriga a sofrer com falta de insumos e equipamentos.
Com isso, o país enfrenta uma queda na oferta de produtos, e a consequência é a inflação. Para o professor da Universidade Católica Andrés Bello, Ronald Balza, a recente desvalorização vai gerar um cenário de escassez. Balza explicou que em 2010, por ser ano eleitoral, o governo vai aumentar gastos públicos. Com mais dinheiro em circulação e importações mais caras, a tendência é a escassez e a consequente inflação.
Omar Barboza, presidente-executivo do partido de oposição Um Novo Tempo (UNT), disse à agência Efe que o novo plano é "um duro golpe no estômago do povo venezuelano e tem o objetivo imediato de gerar dinheiro para o governo em um ano eleitoral". Com a desvalorização da moeda, a receita do país tende a aumentar, já que grande parte dela é gerada pela venda de petróleo em dólar.
Já Rodrigo Cabezas, ex-ministro das Finanças de Chávez, aprova a medida recente. "O que temos de conseguir com o equilíbrio cambial, em um contexto de recuperação dos preços do barril de petróleo e de uma política fiscal responsável, é retroceder o movimento dos preços na Venezuela", disse. Em sua visão, o país entrou "em uma espécie de parêntese para recuperar o caminho do crescimento econômico e da estabilidade cambial e monetária".