quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

O JUIZ GOZA FÉRIAS OU SOFRE FÉRIAS? POR AGNALDO, JUIZ

A pergunta pode soar esdrúxula, inconveniente ou, até mesmo, uma “zombaria” para os incautos aos meandros do Poder Judiciário pois, para a maioria dos trabalhadores, férias é sinônimo de praia/sol, maracanã/futebol, bebida gelada/homem/mulher bonita, rede, sombra/água fresca e pés descalços ou calçado largo e, ao fim de 30 dias, retornar para o serviço totalmente descansado, com as energias recompostas e apto a dar continuidade ao seu serviço que, no respectivo período, foi realizado por um substituto.
Assim acontece em todos as atividades: a empregada doméstica, quando sai de férias, no dia que retorna não lava as vasilhas do mês que folgou; o gari, ao retornar ao serviço, não varrerá e apanhará o lixo de 30 dias; o vaqueiro não ordenhará o leite do período de férias; o gerente não terá que atender os clientes do período, o vigário, em igual diapasão, não celebrará as missas pretéritas, etc...
Com o magistrado, entretanto, é diferente — realidade pouco difundida e a que a maioria fecha os olhos. Perguntam os demais trabalhadores: que diferença é essa? E, confiantes do acerto, os próprios respondem: o juiz também goza férias sim, inclusive de 60 dias! Entretanto, estão redondamente enganados, pois a diferença está, primeiro, na estrutura equivocada e arcaica imposta ao Poder Judiciário, com número de juízes insatisfatório e, segundo, pela escravidão imposta pela lei quando exige a identidade física do juiz.
Desconhecendo o alcance da justificativa, retrucam, incrédulos, que isso não faz diferença, guardando no íntimo: “isso é mais uma estória para boi dormir”.
Vejam, então, como exemplos, algumas desigualdades:
Utilizando os dados de Juiz da 5ª Vara Cível de Governador Valadares como paradigma — e posso afirmar que é o que acontece com 90% dos Magistrados —, vou mostrar-lhes o quando esses fatos fazem a diferença.
Pelo princípio da identidade física, o juiz está vinculado aos processos que instruir, ou seja, se o juiz ouvir as partes, as testemunhas, etc, terá que sentenciá-lo, sob pena de nulidade da sentença, salvo, lógico, se é promovido ou morre.
Se o juiz tiver em seu poder, por exemplo, 100 processos para sentença quando sair de férias, podem estar certos, no dia que retornar, os 100 processos estarão na prateleira aguardando julgamentos, com uma única diferença: haverá poeira sobre eles, que deverá ser limpa, evitando doenças.
No caso dos despachos e decisões interlocutórias, apenas alguns processos são apreciados pelo Juiz Plantonista, pois, nas férias, dito Magistrado, além de continuar com o serviço atinente à Vara da qual é titular, responde por mais dois, três ou quatro Varas, reservando-se, então, para decisões de caráter urgente.
No tocante às audiências, a cena se repete, pois o Plantonista tem a sua pauta e, no período, estará respondendo por outras Varas, limitando-se a, com sacrifício, realizar audiências urgentes (réus presos, por exemplo).
Desta forma, quando o juiz retorna das férias, tem que despachar todos os processos e, também, realizar todas as audiências que seriam realizadas no período.
O Tribunal não está estruturado para, no período de férias do magistrado, designar outro juiz para, pelo menos, despachar os processos e realizar as audiências.
Isso significa dizer que, no período em que o titular da Vara estiver de férias, os processos são literalmente armazenados em prateleiras para irem ao juiz no dia do retorno.
Mas, o que isso representa em termos de acúmulo de serviço? Em resposta, demonstrarei as consequências, utilizando, para tanto, a minha média mensal de sentenças, despachos e audiências realizadas neste ano de 2004, a saber: “Proferi, em média, 130 sentenças, exarando 600 despachos e realizando 71 audiências por mês (6,5 sentenças, 30 despachos e 3,5 audiências, em média, por dia).”
Juízes ágeis e experientes, desconsiderando o período indispensável para estudo do processo e das leis aplicáveis à espécie, apenas para materialização (ou seja, escrever, digital, presidir) dos atos, despendem, em média, uma hora para proferirem cada sentença, cinco minutos para cada despacho e uma hora para realização de cada audiência.
Ocupei, então, 240 horas por mês para a materialização do trabalho. O volume, a princípio, não assusta. Entretanto, a parte intelectual e mais importante sobrou como “dever de casa” e estudos nos fins de semana.
Assim, o serviço não realizado no período de férias será executado, obrigatoriamente, quando do retorno. Mas, recebendo a mesma quantidade de serviço, pois as secretarias não param de trabalhar e os advogados, de distribuírem novas ações, o trabalho será dobrado e o labor, então, será insuficiente para manter o serviço em dia. O acumulado obrigatoriamente e na medida do possível é diluído nos meses seguintes.
A carga de trabalho, como podem constatar, já é incômoda e, com essa modalidade de conceder férias, dão azo, então, ao acúmulo de serviço e à demora na prestação jurisdicional.
Isto, entretanto, é só parte do problema, eis que:
1º) o juiz, pelas regras internacionais, deve receber 500 processos por ano, atendendo a uma população de 5 mil habitantes. No meu caso, recebo em média de 176 por mês, com acervo de 2.594 processos, e população de jurisdicionados da ordem de 25 mil habitantes;
2º) com essa distribuição e “estoque” flutuante, é humanamente impossível que o juiz mantenha o serviço em dia, dando azo ao acúmulo, seja para sentenças, despachos ou realização de audiências;
3º) o juiz vive atormentado com a cobrança da sociedade. É taxado de marajá e responsabilizado pela morosidade no trâmite dos processos, quando, em verdade, diante dessa estrutura e com leis processuais arcaicas, até Jesus seria novamente crucificado;
4º) o excesso de trabalho gera doenças e reduz o rendimento, formando um ciclo vicioso (licenças médicas/acúmulo de serviço), culminando com baixa produção intelectual e aumento do acervo de processos pendentes de apreciação.
Pois bem.
Voltando “à vaca fria”, com perspectiva de gozar férias em janeiro de 2005, o que de fato aconteceu, vislumbrei momentos críticos no meu retorno, pois, infelizmente, devolvi, sem as respectivas decisões, 66 processos.
O temor era pertinente. Fiéis, todos os processos retornaram para o meu gabinete e, aliados à pauta de audiências, estão se encarregando de consumir, nos primeiros dias, todos os benefícios oriundos das férias. Com isso, para não variar, o serviço continuará acumulado, e as partes, reclamando da demora na prestação jurisdicional.
Estou trabalhando para decidir os processos pendentes (do ano passado) e, de quebra, para não perder o costume, suplementando a mísera carga de trabalho, apreciando na medida do possível, os novos processos, recebidos no primeiro dia do retorno, a saber: 120 processos conclusos para sentença e 880 para despachos e decisões interlocutórias, totalizando 1.000 processos.
Mostro, com isso, que na atual conjuntura, ter direito a uma, duas, três, ou mais, férias por ano não muda em nada a situação do magistrado e/ou da agilidade/morosidade na prestação jurisdicional, pois, por não ter quem o substitua, terá que lavar toda a louça, a roupa suja, passar, limpar, cozinhar, etc, relativos ao período que esteve de férias, mantendo-se cansado, esgotado e improdutivo.
Neste contexto, urge que o Tribunal adote medidas para que, nos períodos em que os juízes titulares de Varas estejam gozando férias, outros respondam, com dedicação exclusiva, pelas respectivas Varas, mantendo-se os processos em pleno andamento. Outra providência é postular a modificação da legislação visando extinguir o princípio da identidade física do juiz, possibilitando que o juiz substituto e/ou plantonista sentencie, despache e realize audiências em todos e quaisquer processos.
Já que estou lavando a roupa suja e tirando o lixo debaixo do tapete, pondo-os à mostra, para que os leitores tenham melhores condições de sopesar o trabalho de um Juiz, guardadas as respectivas proporções, faço um paralelo com o trabalho realizado pelos párocos, incansáveis conselheiros e que sabem, como nós, como é trabalhar com as mazelas e dar, no momento certo, os conselhos que serão o mote para os infortunados. Para tanto, tomei em consideração os dados obtidos com operoso e incansável padre de Governador Valadares, o qual afiançou-me que um padre leva, em média, uma hora para celebrar cada missa — apenas a celebração, sem computar o tempo destinado aos preparativos —, 30 minutos para cada confissão e milhares de minutos para outros afazeres, como novenas, casamentos, batizados, primeira eucaristia, consultas, reuniões, palestras, grupos de orações, agendamento de missas, entrevistas, etc.
Eis o resultado:
Os padres, antes da missa, precisam preparar os sermões, as cantigas e a dinâmica. Assim, na melhor das hipóteses, a materialização da missa (ou seja, a celebração) pode ser comparada com uma sentença. O padre então, teria que celebrar, em média, seis missas por dia.O padre confessa os paroquianos, ouvindo-os. Sabemos que algumas confissões são demoradas — depende do confidente e dos pecados — mas, para fins de parâmetros, pode-se adotar a paridade de tempo equivalente a meia audiência para cada confissão. O incansável padre, então, não conseguirá ouvir mais do que 140 pecadores por mês, ou seja, sete por dia.
E, como despachos, por analogia, temos os demais afazeres do padre na comunidade, equivalentes a 2,5 horas diárias, tempo insuficiente para as novenas, casamentos, batizados, primeira eucaristia, consultas reuniões, palestras, grupos de orações, etc.
O dia, como visto, é curto para tanta atividade e, para piorar a situação, imaginem quanta confusão haverá se o bispo não mandar substituto (plantonista) no período que o vigário estiver gozando férias! Noivos adiando sonhos, pecadores atormentados, crianças frustradas, beatas inconsoláveis, dízimo em baixa e capela fechada, inviabilizando e postergando o anúncio da palavra de Deus, para delírio da “capetada”.
Por estas e outras que sempre lembro: “pimenta no olho dos outros é refresco” e “o dono do pé é que sabe onde o calo dói”.
Concluindo, em homenagem ao meu retorno, “Para os juízes da nossa querida Minas Gerais, estar de férias é, sem medo de errar e de ser feliz, sofrer férias”.
AGNALDO RODRIGUES PEREIRA é 26º Juiz de Direito Auxiliar em Belo Horizonte.
Revista Consultor Jurídico, 3 de dezembro de 2009

CNJ QUER ESCLARECIMENTOS DE 3 DESEMBARGADORES DO DISTRITO FEDERAL CITADOS NO CASO DO GOVERNADOR ARRUDA

O Conselho Nacional de Justiça quer que três desembargadores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal prestem esclarecimentos sobre o escândalo envolvendo o governador José Roberto Arruda. Em conversas gravadas durante a investigação de suposto esquema de corrupção, os envolvidos no caso citam os nomes dos desembargadores.
O pedido de providências para analisar o caso foi assinado pelo conselheiro Ives Gandra, que substitui temporariamente o corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp. Por meio de ofício dirigido ao presidente do TJ-DF, desembargador Nívio Gonçalves, o CNJ determina que prestem informações sobre o envolvimento de seus nomes no noticiário, que apontou conversa da cúpula do governo do DF sobre processos e desembargadores do TJ-DF. Os desembargadores Getúlio Pinheiro Sousa, Romeu Gonzaga Neiva e José Cruz Macedo terão 15 dias para responder ao Conselho.
Em resposta ao portal G1, a assessoria de imprensa do TJ-DF informou que o ofício do CNJ ainda não chegou ao tribunal e que, quando chegar, as informações serão prestadas dentro do prazo. A assessoria destacou ainda "que não faz o menor sentido a citação dos desembargadores, pois todas as denúncias foram recebidas pelo TJ-DF e com votos favoráveis dos três magistrados".
Ainda de acordo com o portal, os desembargadores são citados em conversas entre Arruda, o ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa, responsável pelas denúncias do suposto esquema de corrupção, e o ex-chefe da Casa Civil José Geraldo Maciel. Gravação feita com autorização judicial mostra que Durval Barbosa foi chamado à residência oficial por Arruda para tratar, dentre outros assuntos, de um processo que estaria para ser julgado no TJ-DF.
No vídeo, Arruda parece preocupado e diz que vai visitar o presidente do tribunal, desembargador Nívio Gonçalves, para pedir conselhos. Gonçalves, no entanto, não é alvo do procedimento do CNJ, mas foi citado apenas por ser o presidente do tribunal. O governador também cita outro desembargador do TJ-DF. O assunto é o mesmo: um processo que tramita no TJDF. Maciel fala sobre a relação com outro desembargador.
O escândalo do mensalão do DEM de Brasília começou no dia 27 de novembro, quando a Polícia Federal deflagrou a operação batizada como Caixa de Pandora. No inquérito, o governador José Roberto Arruda é apontado como o comandante de um esquema de distribuição de propina a deputados distritais e aliados. Com informações da Assessoria de Imprensa do CNJ.
Revista Consultor Jurídico, 2 de dezembro de 2009
http://www.conjur.com.br/2009-dez-02/cnj-esclarecimentos-desembargadores-df-citados-arruda

RELIGIÃO FAZ JUIZ AUMENTAR PENA DE CASAL HERNANDES DA IGREJA RENASCER

POR ALESSANDRO CRISTO
O juiz da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, Fausto Martin De Sanctis, que condenou o casal Hernandes nesta terça-feira (1º/12), aumentou a pena em um sexto pelo fato de os acusados serem pessoas ligadas à religião, com deveres relativos ao ministério que professam. “Revelam-se de personalidade desajustada”, disse na decisão, afirmando que a atitude “gerou consequências danosas àqueles que sempre acreditaram na boa-fé dos acusados”. O juiz referiu-se à fé dos réus como “seita religiosa”.
Por embarcarem para os Estados Unidos sem declarar US$ 56.467,00 à Receita Federal, Estevam e Sônia Hernandes foram condenados pela Justiça Federal de São Paulo por evasão de divisas. A punição foi de quatro anos de reclusão e 164 dias-multa — cada um equivalente a cinco salários mínimos —, e a repassarem R$ 300 mil a entidades beneficentes. A reclusão foi convertida em pena restritiva de direitos, pela qual o casal tem de prestar serviços a entidades filantrópicas. Eles também foram proibidos de frequentar haras, lojas de luxo e leilões de bens, salvo os beneficentes, além de só poderem viajar para países onde têm igrejas. A sentença, dada nesta terça-feira (1º/12), foi publicada nesta quarta (2/12) pela Justiça Federal.
Os acusados, fundadores da Igreja Renascer em Cristo, foram presos em janeiro de 2007, já nos EUA, onde cumpriram pena de dois anos e meio por ingressarem no país com quantia superior a US$ 10 mil, sem declarar, como determina a lei americana. Eles foram detidos em flagrante, ainda no aeroporto de Miami, com o dinheiro não declarado. O retorno ao Brasil aconteceu em agosto, depois de cumprirem a pena.
O juiz da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, Fausto Martin De Sanctis, que condenou o casal, aumentou a pena em um sexto pelo fato de os acusados serem pessoas ligadas à religião, com deveres relativos ao ministério que professam. “Revelam-se de personalidade desajustada”, disse na decisão, afirmando que a atitude “gerou consequências danosas àqueles que sempre acreditaram na boa-fé dos acusados”. O juiz referiu-se à fé dos réus como “seita religiosa”.
O Ministério Público, no entanto, pediu a aplicação da pena mínima. Os promotores destacaram a boa conduta dos réus e lembraram que eles já teriam assimilado “o peso da conduta ilícita” por terem cumprido pena nos EUA em relação ao mesmo procedimento. O fato de terem o filho, Felipe Hernandes, em coma no Hospital Albert Einstein, também contribuiu para o pedido de alívio.
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A omissão de informar o valor que transportavam foi enquadrada no crime de falsidade ideológica, prevista no artigo 299 do Código Penal, e evasão de divisas, prevista no artigo 22, parágrafo único, da Lei 7.492/86. Em caso de transporte de quantias superiores a R$ 10 mil, a Lei 9.069/95 exige que o valor seja informado à Receita Federal.
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Para o juiz da 6ª Vara, no entanto, o fato de os réus já terem sido condenados nos EUA não influencia a decisão da Justiça brasileira, já que o crime no exterior teria sido a entrada com dinheiro não declarado, e, no Brasil, de saída. Por isso, a pena já cumprida não poderia ser abatida da condenação brasileira. “Seria adequado sujeitar os eventuais condenados apenas às autoridades estrangeiras por fatos aqui antes cometidos que, por si só, já implicariam infração penal à norma brasileira?”, questionou De Sanctis na decisão.
A quantia, para o juiz, deveria ter sido enviada aos EUA via transferência bancária, e não em espécie. O valor apreendido em Miami, segundo ele, serviu de prova material do crime, já que o dinheiro foi encontrado pela polícia no paletó de Estevam, na mochila do filho Gabriel, em um porta CD e em uma Bíblia, o que comprova, para De Sanctis, ter havido “preparação preliminar” do transporte.
Quanto à acusação de falsidade ideológica, De Sanctis absolveu os acusados, já que, por não terem preenchido qualquer declaração às autoridades brasileiras, também não omitiram informações nelas, como tipifica o artigo 229 do CP. Além disso, o crime de evasão de divisas, segundo o juiz, é mais grave, e por isso absorve a pena do menos prejudicial.
Processo 2007.61.81.001487-3
ALESSANDRO CRISTO é repórter da revista Consultor Jurídico
Revista Consultor Jurídico, 2 de dezembro de 2009
http://www.conjur.com.br/2009-dez-02/juiz-aumenta-pena-estevam-sonia-hernandes-eles-serem-religiosos