domingo, 10 de janeiro de 2010

Brasileiros são problema em 6 países vizinhos

FABIANO MAISONNAVE
da Folha de S. Paulo, em Caracas
http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u677060.shtml 
Em 6 de dezembro, 18 dias antes do violento ataque contra brasileiros no Suriname, um avião da FAB aterrissou na remota cidade colombiana de Inirida. A missão: repatriar dezenas de garimpeiros e familiares que fugiram pela selva após uma operação na Venezuela contra imigrantes ilegais.
Naquele dia, 32 brasileiros embarcaram para Boa Vista (RR) e Manaus. Outros 24, detidos na Venezuela nos dias 29 e 30 de novembro, seriam expulsos mais tarde. Mais 75 que escaparam seriam cadastrados pelo serviço consular brasileiro na Colômbia.
Somados aos dez que abandonaram a Venezuela voluntariamente, 141 garimpeiros e familiares deixaram o país de Hugo Chávez após a batida dos serviços de imigração, uma das maiores realizadas contra brasileiros nos últimos anos no país. Do Suriname, semanas mais tarde, voltaram 37.
Limítrofe com dez países, o Brasil é o terceiro Estado com mais fronteiras no mundo, atrás apenas de Rússia e China. Em quase todos, há comunidades brasileiras significativas -o Itamaraty estima que 500 mil brasileiros vivem nos vizinhos.
Desses, seis preocupam mais: os brasileiros têm grande envolvimento com garimpo em quatro (Guiana Francesa [França], Suriname, Guiana e Venezuela), e em dois estão em meio a problemas complexos ligados à terra (Bolívia e Paraguai). No Peru e na Colômbia, há casos esporádicos e em menor escala com exploração de madeira e garimpo, enquanto no Uruguai e na Argentina praticamente não há problemas.
"Muitos dos brasileiros que se encontram nos países vizinhos, especialmente em regiões próximas às fronteiras, fazem parte de desdobramentos de frentes de expansão (mineração, agrícola) do passado (Marcha para o Oeste e expansão capitalista na Amazônia) e do presente (soja) em território brasileiro", afirma o sociólogo José Lindomar Albuquerque, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
"As frentes de expansão no Brasil são lugares singulares de conflitos. Quando essas frentes ultrapassam os limites políticos do Brasil, reproduzem vários desses conflitos, acrescidos de lutas e reações nacionais difíceis de serem entendidas pelos brasileiros", conclui.
Para o Itamaraty, as comunidades brasileiras em países vizinhos atravessam uma situação considerada estável com relação ao aumento populacional e a tensões com governos locais, apesar dos episódios no Suriname e na Venezuela.
"Os nossos imigrantes são trabalhadores, 99% são honestos e vivem tranquilos e integrados", disse, por telefone, a embaixadora Mitzi Valente da Costa, subsecretária interina das Comunidades Brasileiras. "O Suriname foi um incidente isolado, e não foram só brasileiros vítimas dessa noite de violência, foram os residentes daquela cidade [Albina]. Mas não há nenhum contexto de xenofobia ou racismo específico contra o Brasil."
De acordo com Costa, as principais preocupações do Itamaraty atualmente são a Bolívia e o Paraguai -este abriga a maior comunidade brasileira em países da América do Sul. Ali, os chamados brasiguaios têm problemas recorrentes ligados a disputas fundiárias.
Costa descarta que os problemas na Bolívia e no Paraguai estejam ligados ao tom nacionalista dos presidentes Evo Morales e Fernando Lugo.
"De um modo geral, não há essa percepção de que estamos tentando anexar a Bolívia ou o Paraguai. Boa parte dessas comunidades é de filhos com dupla nacionalidade. Trata-se de um discurso que não é sentido no local e não nos preocupa."
Segundo Albuquerque, há um "duplo discurso" sobre os brasileiros: "Para os setores críticos, geralmente marginalizados (indígenas, camponeses, maroons), a presença brasileira representa mais uma forma de dominação de espaços vitais de sobrevivência".
"Para os setores dominantes desses países e que mantêm interesses com o desenvolvimento econômico dessas regiões, são vistos como trabalhadores que estão trazendo a modernização econômica para esses espaços periféricos. Somente podemos entender o caso recente da agressão a brasileiros no Suriname se compreendermos o lugar dos maroons na história."

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